Assinale a alternativa em que o pronome oblíquo lhe está no lugar do pronome oblíquo o ou a, em desacordo com as orientações da norma culta.
Deverá ser usada a ênclise quando a oração é iniciada por um verbo, porque as frases não devem ser iniciadas com pronomes oblíquos. Já a próclise deverá ser usada quando houver palavras atrativas que justifiquem o adiantamento do pronome, como palavras negativas, alguns pronomes e conjunções.
Apontamento do autor no blogue Diário de um Linguista, em 18 de janeiro de 2021, e no Facebook, no dia seguinte.
Regra geral, é facultativo o uso da próclise ou da ênclise na colocação do pronome oblíquo átono na oração. Há, contudo, situações que justificam o uso específico de uma forma de colocação pronominal.
Na frase acima, não caberia o uso do “lhe”, porque esse pronome exerce sempre a função de objeto indireto, ou seja, só deve ser utilizado com verbos transitivos indiretos.
Os pronomes pessoais do caso oblíquo assumem, maioritariamente, a função de objetos na oração (objeto direto ou objeto indireto). Podem ser classificados como tônicos ou átonos.
A ligação dos pronomes oblíquos átonos aos verbos pode ser feita através de próclise (com o pronome colocado antes do verbo), de ênclise (com o pronome colocado depois do verbo) e de mesóclise (com o pronome intercalado no meio do verbo).
É mais comum do que parece a confusão entre os pronomes pessoais do caso reto (eu, tu, ele, nós, vós, eles) e seus correspondentes oblíquos (o,a, te, lhe, vos, os, as).
O emprego dos pronomes pessoais oblíquos em português brasileiro contemporâneo falado (e às vezes também escrito) tem sido um daqueles complexos problemas da nossa língua. É que, em primeiro lugar, temos a tendência a substituir os pronomes átonos o/a/os/as/lhe/lhes pelos tônicos ele/ela/eles/elas: «Eu não vi ele hoje»; «Eu dei o livro pra ele». Em segundo lugar, muitas vezes omitimos o objeto direto quando este é um pronome: «Você viu o Zé? Não vi, não». Em terceiro lugar, o uso do pronome pessoal reto você, que exige os oblíquos o/a/os/as/lhe/lhes, em lugar de tu, acaba criando ambiguidades: «Eu não o conheço!» (não conheço você ou ele?). Por isso, costumamos desfazer a ambiguidade por meio das formas «Não te conheço» (informal) ou «Não lhe conheço« (formal) em oposição a «Não conheço ele».
Os pronomes pessoais oblíquos tônicos são sempre precedidos de uma preposição (para, a, de, com). Podem desempenhar a função de objeto indireto, complemento nominal e agente da passiva. As formas contraídas comigo, contigo, conosco podem ainda atuar como adjunto adverbial de companhia.
Leia também: Pronomes: tudo sobre os diferentes tipos de pronomes e Pronomes: exercícios com respostas.
Só que agora está surgindo o uso exatamente inverso a esse, isto é, a substituição do pronome objeto indireto lhe pelo direto o/a. Tenho visto cada vez com mais frequência construções do tipo «Eu quero proporcioná-lo a melhor qualidade de vida possível» ou «Recebeu o amigo e o ofereceu um drinque».
Porém, como falante do português e amante da cultura letrada, tampouco posso deixar de apontar um fato desolador que, em meu diagnóstico, é a causa dessa mutação: nossa péssima educação escolar. Ou seja, o emprego padrão (isto é, normativo) dos pronomes pessoais em português é um tanto complexo, e, particularmente na variedade brasileira, o uso de pronomes de terceira pessoa com função de segunda traz certa ambiguidade que os falantes procuram contornar como podem. Mas, na hora de redigir é que o bicho pega, pois a maioria das pessoas não sabe usar tais pronomes no registro culto e acaba metendo os pés pelas mãos – ou melhor, acaba metendo o/a no lugar de lhe e vice-versa. Fatos como esses certamente não aconteceriam se as pessoas fossem mais bem escolarizadas e se o hábito da leitura fosse mais difundido. Aliás, desconfio que a própria preguiça que o brasileiro em geral tem de ler se deve à má escolarização, pois os livros, jornais e revistas costumam ser redigidos num linguajar bastante distante do usado no dia a dia, o que requer da parte de quem tem pouca afinidade com o léxico e a gramática um grande esforço intelectual. Ou seja, para essas pessoas, ler cansa.
Ademais, utilizamos o pronome “lhe” para substituir termos preposicionados, ou seja, ele exerce a função de objeto indireto. Já os pronomes “o/a” substituem termos não preposicionados e exercem a função de objeto direto.
No exemplo acima, é possível perceber que, ao nos dirigirmos a uma pessoa com quem não temos intimidade, ao mesmo tempo evitamos o uso de te e do pronome objeto direto o/a, utilizando em seu lugar o pronome objeto indireto lhe: «Não lhe conheço!».
Os pronomes oblíquos átonos assumem as formas lo, la, los, las quando a forma verbal termina em -r, -s ou -z. Essas consoantes finais são suprimidas e os pronomes oblíquos átonos são antecedidos pela consoante l:
Os pronomes oblíquos átonos assumem as formas no, na, nos, nas quando a forma verbal termina em -m ou em outro som nasal. Neste caso a consoante final não é suprimida, permanecendo na forma verbal, mas os pronomes oblíquos átonos são antecedidos pela consoante n:
Em resumo, devemos usar os pronomes pessoais oblíquos da terceira pessoa (lhe ou o/a), quando a pessoa com quem falamos for tratada por “você”. Já se a pessoa for tratada por “tu”, devemos utilizar o pronome pessoal oblíquo da segunda pessoa (te).
Por que isso acontece? Evolução linguística, dirão vocês. Eu, como linguista, não posso negar que isso seja uma inovação que poderá vir a tornar-se uso corrente e predominante. Ou seja, como cientista da língua, não posso deixar de observar o fenômeno como algo natural a que todas as línguas estão sujeitas.