Onde Surgiu O Movimento De Reforma Psiquitrica?

Onde surgiu o movimento de reforma psiquitrica

A REFORMA PSIQUIÁTRICA BRASILEIRA CONSTITUIU um dos mais expressivos movimentos de transformação na área da saúde no País nas últimas quatro décadas. Inspirada por pensadores críticos ao modelo de atenção psiquiátrica predominante e por experiências com práticas de cuidado inovadoras na área, no plano internacional e nacional, a luta antimanicomial mobilizou numerosos atores na academia, nos órgãos públicos, nos serviços de saúde e nos movimentos sociais. A democratização da sociedade e a reforma sanitária, nos anos 1980, impulsionaram as ideias e as iniciativas de mudanças na área, bem como foram por elas favorecidas, dada a relevância do movimento antimanicomial no âmbito dos processos de luta pela ampliação dos direitos e da noção de cidadania.

The prelude to psychiatric reform in Brazil: the contradictions of the 1970s

O período aqui estudado está compreendido entre 1967 e 1978. O ano de 1967 foi o da criação do Instituto Nacional de Previdência Social — INPS —, por meio da unificação dos institutos de aposentadorias e pensões, tornando-se um novo paradigma na conformação do modelo médico-assistencial privatista que então se iniciava. E 1978 foi o ano de surgimento do Movimento da Reforma Psiquiátrica, nascido no contexto da crise da Dinsam, desencadeando a formação do Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental, embrião de todo um processo de reflexões teóricas e práticas inicialmente alternativas no campo da assistência psiquiátrica.

Como já foi dito, uma marca do sistema de internações psiquiátricas públicas no Brasil é o fato de elas não acontecerem apenas nos hospitais públicos propriamente ditos, mas em instituições privadas que são remuneradas pelo setor público para oferecerem internação à população atendida a expensas do SUS. Dos cerca de 62 mil leitos em hospitais psiquiátricos mantidos pelo SUS em 1996, aproximadamente cinqüenta mil (80%) eram leitos contratados em instituições privadas. Para 45 hospitais públicos, havia 211 contratados. A maioria dessas clínicas tem como única fonte de receita as verbas públicas, que só se lhe são destinadas como pagamento de internações.

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Em 1966 Luiz Cerqueira denunciava, em seu trabalho 'Pela reabilitação em psiquiatria', a situação de cronicidade dos doentes mentais. Representando o setor dos prestadores privados de saúde em geral e da psiquiatria em particular, naquele mesmo ano foi fundada a Federação Brasileira de Associações de Hospitais, que na década de 1970 passaria a ser denominada Federação Brasileira de Hospitais. Os empresários do setor privado viam na psiquiatria uma área de serviço de fácil montagem, sem necessidade de tecnologia sofisticada ou pessoal qualificado (Amarante,1995).

Em 2005 foi publicada uma portaria do Ministério da Saúde gerando financiamento da supervisão clínico-institucional e traçando suas coordenadas para os serviços em fase de implantação que solicitassem esse suporte. A proposta era de instaurar a prática da supervisão clínico-institucional como um dispositivo permanente dos CAPS sob a responsabilidade dos municípios no modelo do SUS. Outras leis e portarias do Ministério da Saúde se destacaram em decorrência do avanço das políticas públicas em saúde mental. Entre as principais temos a regulamentação dos Serviços Residenciais Terapêuticos em 2000, a Lei 10.708 de 2003 instaurando o benefício De Volta pra Casa para pacientes de longa internação, e a criação da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) através da Portaria 3.088 de 2011 consolidando os dispositivos que devem dar sustentação ao trabalho de base territorial articulado em redes.

Serviços Personalizados

Ainda assim, alguns autores propõem, em lugar de comunidade, o conceito de território, inspirado na psiquiatria democrática italiana (Delgado, 1997a, p. 42). Território como algo que demarca a regionalização da assistência, mas que é muito mais do que isso: "o território não é o bairro de domicílio do sujeito, mas o conjunto de referências socioculturais e econômicas que desenham a moldura de seu quotidiano, de seu projeto de vida, de sua inserção no mundo". A noção de território aponta, assim, para a idéia de territórios subjetivos. Em lugar de psiquiatria comunitária e preventiva, fala-se hoje em atenção psicossocial e território.

ROTELLI, Franco; LEONARDIS, Ota de; MAURI, Diana. Desinstitucionalização, uma outra via. In: NICÁCIO, F. (Org.). Desinstitucionalização. São Paulo: Hucitec, 1990. p. 17-59.         [ Links ]

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A nova legislação permitiu um surto de construção de hospitais em vários estados, como Sergipe, Santa Catarina, Espírito Santo e Alagoas, que criaram seus nosocômios com características de hospitais-colônias. Muitos deles eram extremamente precários ou distantes dos centros urbanos.

Ainda assim, costuma-se apontar o legado ideológico positivo desta experiência e sua influência sobre algumas experiências recentes da atual reforma psiquiátrica brasileira. Teixeira (op. cit., pp. 258 e ss.) questiona a própria qualificação de fracasso do movimento. Descrevendo as comunidades terapêuticas como uma tentativa de "montar um espaço institucional onde predominasse um tipo de relação social mais liberal e equânime", o autor reconhece o "artificialismo intrínseco à montagem de um modelo ideal de grupo societário sob a forma de um projeto clínico/psiquiátrico" e aponta outros limites internos à experiência, que, não se propondo a uma ruptura com os asilos, veio a ser apenas um "intervalo liberal da vida asilar, que é seguido por um retorno ao modelo autoritário tradicional".

La prevalencia de la práctica de hospitalización psiquiátrica de personas consideradas locas ocurre en respuesta social adecuada a las condiciones de emergencia de las sociedades modernas y contemporáneas. Las principales críticas del modelo de asilo se dirigieron al carácter cerrado y autoritario de la institución, dando lugar a varios intentos de reformar tanto el hogar de ancianos como los conocimientos de la psiquiatría tradicional. El objetivo de este trabajo fue presentar las principales experiencias de Reforma Psiquiátrica en diferentes países y en el contexto brasileño. Como recurso metodológico se utilizó la revisión de la literatura. Las diversas experiencias de Reforma Psiquiátrica surgieron de la crítica del modelo de asilo de tratamiento. La Psicoterapia Institucional y Comunidades Terapéuticas se configuraron como reformas de asilo restringidas; la Psiquiatría de Sector y Psiquiatría Preventiva excedieron el alcance de asilo; y la Antipsiquiatría y Psiquiatría Democrática promovieron rupturas con los modelos anteriores. En Brasil, la Reforma Psiquiátrica se entiende como un proceso social complejo que requiere cambios en cuatro dimensiones interdependientes: la teórica-conceptual, legal-política, técnica-asistencial y sociocultural.

Knowing the origins of the Brazilian psychiatric reform: the French and Italian experiences

Pedro Gabriel Delgado (1992, Apresentação) observa que as iniciativas reformadoras prosseguiram ao longo do século XIX, visando agora dar orientação científica aos estabelecimentos especializados. Na virada do século XX, a reforma passou a se orientar pela crítica à insuficiência do asilo, produzindo, por exemplo, o modelo das colônias agrícolas. Também a consolidação da estrutura manicomial do Estado na era Vargas deu-se como um 'desafio reformista', e o "'fugaz movimento da psiquiatria comunitária, entre os anos 60 e os 70" é outra iniciativa do "reformismo no campo da saúde mental" no Brasil.

Ce text présente une bref révision du mouvement de la reforme psychiatrique après les années 70 jusqu 'aujourd 'hui et discute les articulations entre la reforme et les profissionnels de la Psychologie et de la Psychanalyse en proposant à travers l 'orientation psychanalytique quelques coordonnées pour le travail collectif des équipes dans la santé mental et ses interfaces.

Outra característica importante da experiência italiana é o fato de ela ter sido construída e ter-se expandido a partir da desmontagem interna das instituições e não do estabelecimento de uma política geral por parte de administradores ou ideólogos profissionais. A eliminação do hospital psiquiátrico foi o ponto de chegada e não de partida. Para o êxito dessa empreitada, foi essencial a construção de uma rede de estruturas regionais de assistência que não fossem externas ou complementares, como na experiência francesa. A radicalidade italiana consiste na pretensão de que essa rede substitua de fato o hospital psiquiátrico. A autora aponta então para uma questão vital, que toca profundamente a experiência brasileira: até que ponto as estruturas substitutivas rompem de fato com a psiquiatrização dos problemas sociais e da população? Com o intenso aumento no consumo de psico-fármacos, o hospital corre o risco de tornar-se anacrônico. O controle dos corpos se faz de forma mais sutil, através da neurobioquímica.

'Revogaço' 

Documentos oficiais produzidos pelas autoridades sanitárias na década de 1980 observavam com propriedade o caráter perverso da relação entre poder público, rede privada e modelo asilar: o Plano Conasp de Psiquiatria, divulgado pelo Inamps em 1983, apontava o "sinergismo que ocorre entre o modelo assistencial prevalente (asilar), a modalidade da contratação dos serviços no setor privado e a baixa eficiência do sistema de controle de qualidade exercido pelo Inamps" (Leal, op. cit., pp. 12, 13). A Proposta de Política de Saúde Mental da Nova República, de 1985, mostrava que a crítica germinada nos dez ou 15 anos anteriores não mudara a política de financiamento de internações: dos recursos gastos pelo Inamps em serviços psiquiátricos contratados junto às clínicas privadas, 81,96% destinavam-se à área hospitalar, e 4%, à assistência ambulatorial.

The prevalence of psychiatric practice hospitalization of the so called "crazy" occurs as a socially appropriate response to emergency conditions of the modern and contemporary societies. The main criticism of the asylum model addressed the closed and authoritarian character of the institution, giving rise to various attempts to reform both the nursing home and the traditional psychiatric knowledge. This paper aimed to present the main experiences of Psychiatric Reform in different countries and in the Brazilian context. Literature review was used as a methodological resource. The various experiences of Psychiatric Reform emerged from the criticism of the asylum model of treatment. Institutional Psychotherapy and Therapeutic Communities are configured as restricted asylum reforms; Sector Psychiatry and Preventive Psychiatry exceeded the scope of asylum; and Antipsychiatry and Democratic Psychiatry promoted breaks with previous models. In Brazil, Psychiatric Reform is understood as a complex social process that requires changes in four interdependent dimensions: theoretical-conceptual, legal-political, technical-assistance and sociocultural.

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À diferença de outras áreas de saúde, na psiquiatria, a diminuição do número de leitos e hospitais é um índice positivo – desde que acompanhado pela criação de alternativas de assistência. As análises existentes convergem ao apontar que o processo em curso no país não consiste em um desmantelamento da rede hospitalar, mas na sua transformação para alternativas não hospitalares (Alves, op. cit.). Na primeira metade da década de 1990, foram inaugurados quase cem serviços de atenção diária: em abril de 1996, os dados disponíveis registravam 106 serviços de atenção diária, sendo que este tipo de serviço praticamente inexistia seis anos antes. Na ocasião, considerava- se que a substituição asilar vinha acontecendo "de maneira inequívoca e regular no Brasil nos últimos dez anos", e que se podia esperar uma aceleração do processo (Delgado, 1997a, p. 9). De fato, o ritmo foi mantido na segunda metade da década até os dias atuais: em setembro de 2001, na Conferência Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, o coordenador de Saúde Mental do Ministério da Saúde, Pedro Gabriel Delgado, divulgava a existência de 275 serviços dessa natureza no país.

Outra vertente da reforma (Lancetti, 1990; Amarante, op. cit.), porém, considera que uma prática efetivamente transformadora junto aos loucos deve visar justamente à superação do paradigma da clínica. Seu raciocínio é de que, ao operar com a idéia de doença mental como negativo da razão e como desvio em relação a um padrão normal de subjetividade, a clínica impõe necessariamente ao louco um lugar de negatividade. Bezerra Jr. (1994) observa que, se em algum momento esta polaridade assumiu ares de confronto e rivalidade, o amadurecimento do processo concreto de transformação da psiquiatria levou a que as duas vertentes viessem a operar de forma complementar e solidária.

Notícias

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Repórter - A Associação Brasileira de Psiquiatra (ABP) apoiou a nova Política de Saúde Mental, implementada em 2017, que trouxe algumas mudanças nas concepções de 2001. A ABP avalia que, na prática, a reforma psiquiátrica de 2001 não atingiu os resultados esperados, deixando parte da população desassistida. A entidade defende especialmente investimentos consistentes em ambulatórios especializados. Como o senhor avalia a posição da ABP?

Vaissman (op. cit.) entende que, apesar de todas as dificuldades para a implantação de programas de perfil preventivista no período, o projeto de uma psiquiatria comunitária, tendo em vista a organização social dos serviços psiquiátricos na Previdência Social, foi correto. Significou a incorporação e o reconhecimento, por parte da instituição, da necessidade de uma psiquiatria que atendesse aos interesses da classe trabalhadora, considerando-se fundamental a participação comunitária.

Após sua passagem pelos Estados Unidos e a implantação da comunidade terapêutica no Hospital Psiquiátrico, Basaglia dirigiu-se para Trieste, onde, com o intuito de eliminar o manicômio, consolidou um significativo movimento epistemológico e político acerca das instituições manicomiais e da doença mental. Por meio da destruição dos tratamentos violentos, bem como dos muros que separavam a parte interna da parte externa do hospital, Basaglia propôs novas maneiras de lidar com a loucura (ROTELLI; AMARANTE, 1992).

Quando foi a reforma psiquiátrica?

A Reforma Psiquiátrica depois da lei Nacional (2001 -2005) É somente no ano de 2001, após 12 anos de tramitação no Congresso Nacional, que a Lei Paulo Delgado é sancionada no país. A aprovação, no entanto, é de um substitutivo do Projeto de Lei original, que traz modificações importantes no texto normativo.

O que foi o movimento da reforma psiquiátrica?

A Reforma Psiquiátrica Brasileira é um movimento sociopolítico ocorrendo no âmbito da saúde pública que, do ponto de vista da gestão de políticas públicas, consubstancia-se em uma legislação em saúde mental iniciada em 1990, com a Declaração de Caracas, aprovada por aclamação pela Conferência Regional para a ...

Qual a importância do movimento iniciado por Basaglia?

O movimento propôs a abertura dos hospitais psiquiátricos e a criação dos dispositivos de tratamento em meio aberto aos sujeitos em sofrimento psíquico. e. O movimento propôs um novo modelo de tratamento dentro das instituições psiquiátricas, acreditando que as relações é que produzem o contexto do manicômio.

Como era o tratamento das pessoas antes da reforma psiquiátrica?

Os doentes mentais eram tratados como animais, vivendo em condições desumanas, dormindo sobre capim sujo de fezes e urina. Se as medidas farmacológicas não fossem suficientes, a terapia de choque e a lobotomia eram feitas, sem qualquer aprovação das famílias, daqueles que ainda as tinham.

Como era o tratamento dos loucos antigamente?

Mesmo após as reformas instituídas no século XIX por Pinel, um dos primeiros a aplicar uma "medicina manicomial", o tratamento dado ao interno do manicômio ainda era mais uma prática de tortura do que a uma prática médico-científica.

Como era o manicômio antigamente?

Antigamente, os tratamentos usados com as pessoas que eram ditas loucas, eram muito cruéis e desumanos, e por isso ficaram marcadas na história. Torturas dos médicos com os pacientes e lendas de assombrações sobre manicômios são muito comuns, e são até inspiração para filmes e seriados.

Como a depressão era vista antigamente?

O conceito de loucura data da antiguidade, estando, no entanto, associado a questões místicas. Assim, o livro começa resgatando tempos bíblicos e mitológicos em que a loucura e a melancolia (designação antiga de depressão) estavam ligadas às superstições: ser louco e melancólico era visto uma punição divina.

Como é feito o tratamento psiquiátrico?

O tratamento psiquiátrico é realizado por meio de um diagnóstico com base no DSM (manual de transtornos mentais) e se dá com a prescrição de remédio aliado à psicoterapia. A função do remédio é a de amenizar os sintomas do paciente.

Como eram tratados os doentes mentais na idade média?

O doente mental passou a ser visto como um possuído pelo demônio, dessa forma o tratamento antes humanitário foi mudado para: - Espancamentos, - Privação de alimentos, - Tortura generalizada e indiscriminada, - Aprisionamento dos doentes para que estes se livrassem dessa possessão.

Como eram os hospitais psiquiatricos antigamente?

Na maioria das vezes, os portadores de doenças mentais viviam confinados em hospitais psiquiátricos como o de Juqueri, em São Paulo, isolados de tudo e de todos, até a morte. Muitos eram submetidos à camisa de força e a técnicas violentas como a lobotomia e o eletrochoque.

Como eram os primeiros asilos psiquiátricos?

Vale ressaltar que muitas bibliografias apontam o primeiro hospício sendo o fundado pelo Frei Jofré, em Valência, na Espanha, em 1410. ... Na verdade, esta instituição não passava de um hospital geral com caráter de albergues para pobres.

Como a loucura era vista no século XVII?

Até o século XVII, a imagem que se tinha da loucura era sua representação medieval de algo místico, desconhecido, considerado o lugar imaginário da passagem da vida à morte. ... Ao mesmo tempo, convivia-se com o chamado “nau dos loucos”, navios que carregavam loucos para outras cidades em busca da razão.

Como era considerada a doença mental até o século XVII *?

Já em meados do século XVII, a loucura, que até então era exaltada como marca do divino, constitui-se em um modo de exclusão, devido às mudanças ocorridas em decorrência do crescimento das cidades, com o poder das relações políticas e com o desenvolvimento da industrialização.