A Ford foi a primeira montadora a se instalar no Brasil, fabricando carros no País por mais de um século. Se nos últimos anos a liderança do mercado estava longe, ainda assim permanecia entre as cinco marcas com o maior volume de vendas, com veículos consolidados entre os mais vendidos.
Eu vejo a Ford como rival de algumas versões de modelos da Jeep, como o Compass Trailhawk (topo de linha). Outra marca com a qual a norte-americana deve brigar por clientes é a Mitsubishi. O volume de ambas, aliás, é bem próximo tanto na soma de vendas de automóveis e comerciais leves, como considerando apenas o segmento de carros de passeio.
Em 2021, a Ford vendeu 17,2% do que emplacou no Brasil dois anos atrás. Neste ano, a marca fechou com 37.778 unidades enquanto em 2019, último ano antes da pandemia, emplacou 218.526 exemplares.
"O alto custo desse tipo de veículo, cujo volume de vendas é baixíssimo em nosso País, reduz ainda mais o leque de opções viáveis economicamente para o mercado brasileiro", pondera o sócio da consultoria Bright Consulting.
Desde o anúncio do encerramento das atividades nas fábricas brasileiras, diversas notícias de venda foram anunciadas. Ainda em janeiro do ano passado, especulava-se que quatro marcas chinesas (Changan, GAC, Geely e Great Wall) estavam negociando a compra das plantas com a Ford, assim como a brasileira Caoa.
Tanto os trabalhadores das fábricas quanto os revendedores de veículos aguardam pelo pagamento de indenização em clima tenso, enquanto os clientes estão sumindo dos showrooms e as vendas da marca, despencando.
A maior parte dos trabalhadores deixaram o complexo no primeiro semestre do ano, mas alguns seguiram produzindo peças para reposição e trabalhando no desmonte da planta até dezembro de 2021.
Um ano depois da abrupta mudança, a situação da marca por aqui mudou radicalmente. De fábricas abandonadas ao encolhimento da rede de concessionárias, passando até por instalações sendo utilizadas por marcas rivais, a Ford ainda tenta se reestabelecer em sua nova fase - com números e novos produtos que indicam uma realidade muito diferente.
O Campo de Provas foi inaugurado em 1978 e é, atualmente, a maior pista de testes da marca na América Latina. Trata-se, realmente, de uma estrutura gigantesca, instalada em um terreno de 4,66 milhões de metros quadrados. São 50 km de pista de testes, com trechos de asfalto e terra, incluindo rampas, lombadas e piscinas de lama. Também há laboratórios e oficinas para testes de produtos.
A montadora acrescenta que as tratativas ainda não foram totalmente concluídas, contudo pontua que estão "praticamente finalizadas". A oval azul se nega a informar os valores pagos até o momento a título de indenização aos revendedores que deixaram a marca, seja por iniciativa própria ou por decisão da própria Ford - que selecionou os parceiros com os quais desejava prosseguir.
Na avaliação do Sindicato dos Metalúrgicos de Taubaté e Região (Sindmetau), a decisão da montadora de deixar o Brasil foi tomada de arbitrária e unilateral, segundo eles, desrespeitando inclusive um acordo de estabilidade no emprego que estava em vigor na fábrica de Taubaté.
Para isso, a linha de produtos importados tem como principal diretriz modelos de segmentos de maior valor agregado e muito bem equipados. Além do esportivo Mustang, a gama passa a ser composta por picapes e SUVs.
Além das fábricas de Camaçari (BA) e Taubaté (SP), a Ford possuía mais três grandes estruturas no Brasil: a planta de São Bernardo do Campo (SP) (que teve as atividades encerradas em 2019, antes do anúncio), a fábrica da Troller em Horizonte (CE) e o Campo de Provas em Tatuí (SP), que a oval azul prometeu manter em pleno funcionamento.
"A Ford não se desfez da área de inteligência. Até o fim do ano, as atividades na fábrica se encerraram e o nosso setor está trabalhando em home office com dois pontos de apoio: um escritório em Salvador e um espaço para análise e estudo de veículos na sede do Senai/Cimatec, onde ficava a planta da JAC Motors, em Camaçari", informa. O engenheiro revelou ainda que a Ford chegou a contratar cerca de 100 analistas para trabalhar na execução de novos projetos para os Estados Unidos.
O quadro de funcionários do Campo de Provas foi reduzido em 2019 e apenas 150 trabalhadores permaneceram empregados (há 15 anos, a Ford empregava cerca de 800 pessoas no local).
Ainda falta negociar o desligamento dos mais de 5.000 funcionários diretos da empresa e saber como ficará o tamanho da rede de concessionários nessa nova fase, na qual a Ford passará a comercializar somente modelos importados.
Neste imbróglio, a Ford chegou a pagar uma indenização de R$ 2,15 bilhões ao Governo do Estado da Bahia. O valor se refere a um termo aditivo de contrato firmado em 2014, quando a montadora se comprometeu a realizar investimentos no complexo industrial de Camaçari em contrapartida a incentivos fiscais e financiamento a capital de giro.
No cronograma da Ford, a unidade fabril da Troller, no Ceará, seria a última a fechar as portas, no último trimestre de 2021. Conforme o prometido, o último jipe foi fabricado em setembro e, até novembro, o complexo ficou responsável apenas pelas peças de reposição. Toda a produção se encerrou no fim do ano.
Contudo, no ano passado UOL Carros teve acesso a documentos e membros da associação, que falaram sob condição de anonimato e deram detalhes sobre as tensas negociações.
De um lado, a Abradif (Associação Brasileira dos Distribuidores Ford) considera que a interrupção "unilateral" da produção local de veículos representa quebra de contrato e reivindica cancelamento imediato do vínculo da montadora com todos os 283 concessionários.
Desde que deixou de ser fabricante, a Ford fez dois lançamentos importantes no mercado brasileiro no segmento de carros de passeio. Vieram o Mustang Mach 1, sucessor do Mustang GT, e o SUV médio Bronco Sport. Preços: R$ 545 mil e R$ 272.650, respectivamente.