A conjuntura atual prospecta cenários difíceis em termos políticos, econômicos, sociais e ambientais, o que pode vir a afetar direitos básicos. Em 2018, os representantes dos estados e municípios relatavam que a fome e a pobreza voltaram a afetar as famílias brasileiras; alguns dados preliminares oficiais já apontam para o retorno do Brasil ao Mapa da Fome.
Organizações nacionais e internacionais, desde o primeiro dia do ano, têm reagido a esse duro golpe à participação da sociedade, retrocesso inaceitável. Conclamamos também os parlamentares brasileiros, que votaram por unanimidade pela instituição da Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional, a terem a mesma dignidade e decência para romper com a arbitrariedade que representa a extinção do Consea.
O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), um espaço conquistado pela sociedade brasileira e referência internacional no combate à pobreza e a fome e defensor do direito à alimentação adequada e saudável, foi extinto no primeiro dia de janeiro de 2019, por meio da Medida Provisória nº 870/2019, editada pelo presidente da República.
O presidente Lula (PT) recompôs o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) que havia sido extinto no governo Bolsonaro. A recriação consta em medida provisória publicada no domingo 1 no Diário Oficial da União.
As deliberações das conferências nacionais de Segurança Alimentar e Nutricional, são por lei, norteadoras das ações do Consea nacional, que exercia papel fundamental na orientação e articulação federativa e democrática junto aos Conseas estaduais e municipais. Essa atuação conjunta reforça a gestão participativa dos bens públicos, a fim de que haja uma melhor aplicação dos recursos em benefício da qualidade de vida das pessoas. A partir da escuta dos problemas que geram a insegurança alimentar e nutricional e a fome, as prioridades e ações podem ser melhor delimitados e caracterizadas em cada território e por grupos populacionais específicos.
Terminou nesta sexta-feira (1) a terceira edição do Fórum Global contra o Racismo e a Discriminação. Durante três dias, ministros de 15 países estiveram reunidos em São Paulo para discutir agendas pela igualdade racial e de gênero.
A decisão de extinguir o Consea nacional não tem consequências formais no funcionamento dos Conselhos estaduais e municipais, mas pode gerar um efeito político cascata em governos que não se sentem à vontade com a proximidade do povo. Há ainda uma perda profunda no processo de articulação pois o Consea nacional sempre foi o responsável por orientar os Conselhos estaduais e municipais quanto aos processos de formulação, monitoramento e avaliação das políticas e planos ligados à soberania e à segurança alimentar e nutricional, estabelecendo diretrizes e prioridades para o controle social e promovendo a articulação da sociedade civil com os governos.
Além de assinar o decreto que recria o Consea, Lula também assinou o que cria a Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e nutricional. Segundo o ministro do Desenvolvimento e Combate à Fome, Wellington Dias, 24 ministérios compõem a estrutura, que também vai atuar pelo fim da fome no Brasil.
Defender o Consea é reestabelecer a participação social na construção e monitoramento da política e do plano de segurança alimentar e nutricional, a partir da escuta do acontece com a vida de cada cidadão e cidadã brasileira.
*Jean Pierre é presidente do Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional do Rio Grande do Norte e Élido Bonomo é presidente do Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional de Minas Gerais
A extinção do órgão foi uma das primeiras medidas tomadas pelo governo Bolsonaro em 2019, via medida provisória. A extinção do Consea desorganizou a nível nacional a coordenação das políticas voltadas para o combate à fome, que atualmente atinge cerca de 33,1 milhões de brasileiros.
No ano passado, o Brasil registrou cerca de 23 mortes violentas intencionais para cada grupo de 100 mil habitantes. Na região da Amazônia Legal, foram quase 34 mortes para cada por 100 mil. Uma taxa 45% mais alta.
Doutora em Saúde Pública pela USP, Universidade de São Paulo, Elisabetta também coordena o Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição da Universidade de Brasília.
O evento acontece no Rio de Janeiro, na segunda (4) e terça-feira (5), antes do encontro dos líderes dos países que compõem o Mercosul: Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai e Venezuela.
Para presidir o Consea, Lula escolheu, novamente, a nutricionista, pesquisadora e professora Elisabetta Recine, assim como em 2017 e 2018. Segundo ela, as reuniões começam nesta terça-feira (28), com foco no combate à desnutrição dos indígenas Yanomami, situação que já custou a vida de centenas de pessoas da etnia, em Roraima.
A atuação do Consea foi importante na garantia de avanços significativos para população, como a inclusão da Alimentação como um direito na Constituição Federal; a aprovação da Política e do Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional; o Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar (PAA); o aperfeiçoamento da Lei de Alimentação Escolar, ao determinar que pelo menos 30% da compra de alimentos sejam da agricultura familiar; a aprovação da Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PNAPO) e o Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo).
Um dos pilares do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan), o Consea congrega representantes de diferentes setores da sociedade brasileiras que representam distintos temas e territórios. O órgão sempre esteve voltado para as populações mais vulnerabilizadas do ponto de vista econômico, social e nutricional, especialmente os agricultores familiares, os povos indígenas e os povos e comunidades tradicionais, as populações que vivem nas periferias das cidades, com recorte de gênero, etnia e de geração.
Segundo o texto, compete ao Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional ‘assessorar o Presidente da República na formulação de políticas e na definição de diretrizes para a garantia do direito humano à alimentação, e integrar as ações governamentais com vistas ao atendimento da parcela da população que não dispõe de meios para prover suas necessidades básicas, em especial o combate à fome‘.
A conjuntura atual prospecta cenários difíceis em termos políticos, econômicos, sociais e ambientais, o que pode vir a afetar direitos básicos. Em 2018, os representantes dos estados e municípios relatavam que a fome e a pobreza voltaram a afetar as famílias brasileiras; alguns dados preliminares oficiais já apontam para o retorno do Brasil ao Mapa da Fome. Percebe-se a redução da renda das famílias, como consequência das taxas de desemprego e da reforma trabalhista e sua decorrente precarização do trabalho e redução de investimento na agricultura familiar.
O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional também foi protagonista para a consolidação do Programa Um Milhão de Cisternas; o Guia alimentar para a população brasileira e o Plano Intersetorial de Combate ao Sobrepeso e Obesidade. Tudo isso com ações intersetoriais e parcerias com outros órgãos, instituições e segmentos organizados da sociedade que fortaleceu as políticas de inclusão social. Muitos destes programas preveem em seus decretos e leis que os Conseas nacional, estadual e municipal participem do processo de acompanhamento e monitoramento. A extinção do órgão pode gerar mais esta consequência, a paralisação de ações importantes para a vida das pessoas em todo o Brasil.
Sua atuação na formulação, monitoramento e avaliação também considerou regiões e territórios que foram abrangidos pela Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, especialmente as áreas com os piores indicadores de insegurança alimentar e nutricional, tais como: regiões com famílias de baixa renda; com escassas oportunidades de trabalho; territórios em que ocorre perda de rebanhos; regiões com êxodo rural e fragmentação familiar decorrente dos processos migratórios; locais de queda da produção de alimentos para o autoconsumo e para a comercialização, com o consequente elevação dos preços dos alimentos; áreas sem acesso à água, seja pelos efeitos da seca em regiões do seminário, seja pelas cheias na região amazônica e pela má gestão dos recursos hídricos nas grandes cidades; entre outras situações que violam o Direito Humano à Alimentação Adequada. Estas prioridades contribuíram para que os segmentos mais vulneráveis e historicamente excluídos pudessem ser ouvidos e suas pautas incluídas nas formulações da política e dos planos de segurança alimentar e nutricional.