As citocinas são polipeptídeos ou glicoproteínas extracelulares, hidrossolúveis, variando entre 8 e 30 kDa, produzidas geralmente em resposta ao estímulo antigênico e que funcionam como um mensageiro químico para regulação do sistema imune adaptativo e inato.
O reconhecimento de mecanismos inflamatórios em condições que vão muito além de infecções ou autoimunidades sugere um papel protagonista dos agentes de modulação da inflamação no nosso horizonte de entendimento do processo saúde-doença. Mais que isso, o fato de a inflamação ser uma resposta frente a ameaças permite a interpretação de que algumas doenças crônicas podem envolver algum tipo de distúrbio no nosso processo de reconhecimento dos inimigos e dos perigos. Evolutivamente, poderíamos estar trilhando um estilo de vida potencialmente incompatível com o que nosso organismo considera uma homeostase saudável e segura.
Por outro lado, em doenças que cursam com processo inflamatório agudo ou crônico, é possível que as citocinas pró-inflamatórias (IL-1b, IL-6, IL-8, TNF) induzam o organismo a criar uma série de respostas caracterizadas por febre, aumento do sono e da síntese de proteínas pelo fígado, redução da ingestão de água e de alimentos, aumento da liberação de corticosteróides, alteração da atividade cerebral das monoaminas, diminuição da atividade do cotidiano e da interatividade social e hiperalgesia(48, 49). Essas alterações ocorrem na tentativa de acelerar as reações enzimáticas defensivas, reduzir a replicação de patógenos, aumentar a proliferação de células imune, imobilizar a área que foi lesada e conservar energia. Como essas respostas possuem características de ativação do sistema nervoso supra-segmentar, parecem que são mediadas pela ação das citocinas no encéfalo(50). Alguns autores demonstraram que a injeção sistêmica de IL-1b produz o aumento na ativação de genes de formação imediata c-Fos em determinadas regiões cerebrais(51). O mecanismo de ação das citocinas sistêmicas no encéfalo é motivo de várias especulações, visto que essas substâncias não atravessam a barreira hematoencefálica(52). Assim, as citocinas pró-inflamatórias poderiam penetrar no encéfalo por via de locais circunventriculares (áreas onde os capilares são fenestrados), por um processo de transporte ativo através de carreador, ou induzir a geração de outros neuromediadores através da ligação ao endotélio vascular(49). Também existe a possibilidade das citocinas pró-inflamatórias (TNF, IL-1 e IL-6) ativarem vias aferentes vagais na região subdiafragmática e nos ramos do hilo hepático e, conseqüentemente, a atividade vagal aferente no núcleo do trato solitário(53). Isso pode ser evidenciado em alguns estudos em que a vagotomia subdiafragmática, a ruptura funcional das células de Küpfer no fígado, a lesão do núcleo do trato solitário e o bloqueio do receptor da IL-1b suprimem a resposta central(54).
A facilitação de longo termo envolve a ativação de fatores de transcrição e alterações na transcrição. Os fatores de transcrição modulam a relação entre o complexo receptor-neuromediador e as alterações na expressão gênica(16).
Normalmente liberadas quando as células estão sob estresse, as citocinas são proteínas que não possuem uma estrutura definida. Às vezes, são comparados aos hormônios, mas não são feitos apenas por células específicas, mas são sintetizados por quase todos os tipos. O contato com um material estranho, o calor extremo e a exposição à luz ultravioleta podem aumentar a produção. Algumas substâncias podem suprimir genes que codificam citocinas pró-inflamatórias, como alguns tipos de interleucina e interferon. Os genes desses às vezes contêm códigos para enzimas envolvidas na ativação plaquetária e produção de óxido nítrico.
Ironicamente, porém, o que os anti-inflamatórios fazem é justamente atenuar os mecanismos fisiológicos responsáveis por superar uma infecção. Genericamente, esses mecanismos residem sob o amplo e antigo conceito de “inflamação” e estão relacionados a todo e qualquer processo de reação imunológica a uma infecção. A reação inflamatória da resposta imune mobiliza um arsenal de células e moléculas para combater o organismo invasor, e parte dessa mobilização redunda na febre, no cansaço e na fadiga que sentimos quando ficamos resfriados. Tomamos anti-inflamatórios, portanto, para reduzir essa reação imunológica de tal maneira que não anule nossa reação imunológica e, ao mesmo tempo, nos faça sentir menos os efeitos desagradáveis da inflamação.
A dexametasona já havia sido proposta como tratamento para as condições irmãs da COVID-19 (SARS e MERS), embora sem dados conclusivos. Na pandemia atual, o estudo RECOVERY forneceu evidências de que o uso de corticoide é benéfico em casos graves de infecção por SARS-CoV-2 ao mostrar que a mortalidade de pacientes já em suporte ventilatório caía em um terço. O fato de que pacientes em quadros leves não foram beneficiados pela dexametasona permite raciocinar, pelo menos teoricamente, que a ação anti-inflamatória só é útil na COVID-19 quando a infecção sai de controle — e que, enquanto o corpo ainda está combatendo o vírus de modo eficaz, o efeito anti-inflamatório não é benéfico.
Ainda assim, isso não significa que todas essas condições relacionadas a processos inflamatórios possam necessariamente ser manejadas com anti-inflamatórios. Há indícios, por exemplo, de que a doença de Alzheimer está relacionada a níveis elevados de citocinas no sistema nervoso central — o que todavia não prova que a mera administração permanente de um anfi-inflamatório controlaria a progressão dessa condição. Além disso, os casos de doenças crônicas tratadas a longo prazo com anti-inflamatórios demonstraram os riscos envolvidos nesta abordagem terapêutica, que, dependendo da situação, pode conduzir a quadros como insuficiência hepática e queda dos níveis das células sanguíneas.
Outro fator transcricional que pode ser ativado durante o estímulo nociceptivo é o NF-kB. O NF-kB é também ativado por mais de 150 estímulos e resulta na indução de inúmeros genes que influenciam na sobrevivência e na manutenção da integridade da função celular. Genes regulados pela NF-kB incluem os : ciclooxigenases tipo 2 (COX-2), óxido nítrico sintetase (iNOS), prostaglandina-sintetase-2, interleucina 6, interleucina 1-b, dinorfina e moléculas de adesão vascular e intercelular(18).
A fractalquina é o único membro da família CX3C, composta por 373 aminoácidos. É expressa na membrana plasmática de células endoteliais, macrófagos, células dendríticas e de quase todos os neurônios sensitivos e do corno dorsal da medula espinal. Após sofrer ação da enzima catepsina-S, sua forma solúvel é liberada e funciona como agente quimiotático para células-T, monócitos, células matadoras naturais e micróglia. Supõe-se que a fractalquina solúvel ative os receptores CX3CR1, presentes exclusivamente na micróglia do sistema nervoso central, levando à fosforilação da enzima p38 MAPK, com consequente liberação de mediadores inflamatórios, estabelecendo, assim, um sistema de retroalimentação positiva que pode contribuir para um estado de dor crônica 2,33.
Os processos inflamatórios são mediados, essencialmente, por células e moléculas. As células envolvidas nestes processos são as células do sistema imune, denominadas leucócitos (“células brancas”, devido ao seu caráter opaco na microscopia e em oposição às hemácias, que são marcadamente vermelhas). Alguns dos principais leucócitos são os macrófagos (responsáveis por literalmente comer e mastigar corpos estranhos), neutrófilos (encarregados de uma ação rápida e altamente destrutiva, como uma espécie de bomba explosiva), as células natural killer (capazes de detectar e atacar células tumorais) e os muitos subtipos de linfócitos (protagonistas da resposta adaptativa e do estabelecimento de imunidade).
A IL-4 é uma glicoproteína de 15 kDa, com propriedades antiinflamatórias e produzida por linfócitos-T-CD4, mastócitos, eosinófilos e basófilos. Tem ação sobre os linfócitos-T e B, células matadoras naturais, mastócitos, sinoviócitos e células endoteliais, usando a via JAK/STAT. Induz a diferenciação de linfócitos-B para produzir IgG e IgE, que são imunoglobulinas importantes nas respostas alérgicas e anti-helmínticas. Atua sobre macrófagos ativados, reduzindo os efeitos das citocinas IL-1, FNTα, IL-6 e IL-8, e inibindo a produção de radicais livres de oxigênio. Além disso, aumenta a suscetibilidade dos macrófagos aos efeitos dos glicocorticoides 2,4.
A IL-13 tem características estruturais e funcionais semelhantes à IL-4, da qual se diferencia por não estimular a proliferação de blastos induzidos por mitógeno ou clones de linfócitos-T e não promover a expressão de CD8α em clones de linfócitos T CD4. Trata-se de uma citocina anti-inflamatória produzida principalmente por células-T-CD4. Atua em linfócitos-B e monócitos, inibindo a produção de óxido nítrico e de várias citocinas, como IL-1α, IL-1β, IL-6, IL-8, IL-10, IL-12, proteína inflamatória de macrófago-1α, IFNα e FNTα. Além disso, aumenta a síntese de IL-1AR 1,4.
A IL-6 é uma citocina pró-inflamatória que promove maturação e ativação de neutrófilos, maturação de macrófagos e diferenciação/manutenção de linfócitos-T citotóxicos e células matadoras naturais. Além disso, ativa astrócitos e micróglia, e regula a expressão de neuropeptídeos após lesão neuronal, contribuindo para sua regeneração. Contudo, também exerce propriedades anti-inflamatórias durante a lesão, por liberar receptores solúveis de FNT (sFNTRs) e IL-1AR 1,4,5.
Diferentemente dos hormônios clássicos, as citocinas não são armazenadas como moléculas pré-formadas. Elas são sintetizadas a partir da necessidade das mesmas ou quando alguma célula do sistema imune é “ativada”.
Suponhamos que você esteja se sentindo resfriada ou resfriado. Ontem, os espirros começaram ao longo do dia, ao que se sucedeu um quadro de dor de garganta e febre ao entardecer. O cansaço é grande, de modo que você vai dormir mais cedo que o normal e acorda hoje em situação similar: a febre persiste com fadiga corporal e um desconforto geral que ameaça prejudicar suas atividades diárias. Já com um pouco de preocupação e de olho na pandemia, procura então atendimento médico, onde faz o teste para COVID-19, que resulta negativo. Após o exame físico, no qual não se constata qualquer sinal de infecção bacteriana (o que justificaria um antibiótico), você volta para casa com o diagnóstico de uma virose e com indicação de descanso, ingestão de muita água, alimentação saudável — e a prescrição de um anti-inflamatório.
Em que pesem as dificuldades e perdas impostas pela pandemia, a COVID-19 não deixa de ser bom caso de estudo das relações entre infecções e anti-inflamatórios. Ao longo de 2020, muitos tratamentos foram propostos e testados, mas pouquíssimos se comprovaram eficazes. Talvez o fármaco mais promissor do primeiro ano de pandemia seja a dexametasona, um antigo anti-inflamatório esteroide, cujo uso em quadros graves causados pelo SARS-CoV-2 mostrou-se vantajoso em alguns estudos.
This review aims to describe the interaction between cytokines, glial cells and pain mechanism. Humans can identify an aggressive stimulus and memorize it for their own defense to face new threats through a withdrawal motor phenomenon and sympathetic nervous system activation. As the glial cells have the same receptors and transduction systems as neurons, there is dynamic interaction between these cells in the amplification of neuronal response to the peripheral or central aggression. In both, tissue injury activates endothelial cells, the microglia, the astrocytes, permeating the site with immune cells and producing cytokines and chemiokines. If the aggressive stimulus persists, glial responses' self-regulatory properties would not be able to maintain appropriate biochemical homeostasis making the neuron develop to cell dysfunction and programmed death. From the other side, in diseases with chronic or acute inflammatory process it is possible that cytokines induce responses in order to accelerate defensive enzymatic reactions, reduce pathogenic replication, increase immune cells proliferation, fix injured site and conserve energy. And so, cytokines can be recognized by neurons and used to provoke several intracellular reactions that will determine electric nervous activity alterations for undetermined time.
Além da dexametasona, o tocilizumab — que, como vimos, é um fármaco de atividade anti-inflamatória altamente específica por inibição da interleucina 6 — também foi estudado na COVID-19. Partindo da hipótese de que a tempestade de citocinas é um eixo central da patogênese dos quadros graves de COVID-19 e unindo isso ao fato de que a interleucina 6 desempenha, pelo menos em teoria, um papel importante neste desbalanço inflamatório, testou-se o tocilizumab. Dados preliminares fornecidos pelo estudo internacional REMAP-CAP sugerem que o tocilizumab estaria associado a redução de mortalidade e de tempo de internação nas unidades de tratamento intensivo, embora mais evidências ainda sejam necessárias para determinar o papel deste fármaco — ademais caro e menos acessível que a dexametasona — nos quadros de COVID-19.
Citocinas são um grupo heterogêneo de proteínas de baixo peso molecular, extremamente potentes, que iniciam sua ação através da ligação a receptores específicos, provocando alteração da síntese do RNA e de proteínas de diferentes células do organismo. Podem agir no local onde são produzidas, em células próximas ou são secretadas para circulação, com efeitos à distância(29).
Embora estudos in vitro indiquem que a IL-2 é pró-inflamatória, sua injeção intraplantar promove efeito anti-hiperalgésico 7. A aplicação de IL-2 no locus ceruleus de ratos inibiu a sensação nóxica 8.