A premissa criativa de Arranha-Céu – Coragem Sem Limite (ainda não fui convencido por esse título) é uma só: existe um prédio muito alto e o Dwayne “The Rock” Johnson vive cenas de ação lá. A partir daí cria-se uma história para justificar essa ideia, um roteiro pouco verossímil é encenado e o resultado é uma sequência de 1h40min de pequenas cenas em que os personagens quase morrem.
Will Ford (Dwayne Johnson) é um ex veterano que perdeu a perna no passado, mas refez sua vida ao lado de sua esposa Sarah (Neve Campbell). Pai de gêmeos, o protagonista é chamado por um amigo para cuidar da segurança do edifício mais alto da China, mas não sabia que na verdade era apenas uma armação, um complô contra o dono do lugar.
Will se prepara bastante para impressionar Zhao Long Ji (Chin Han) e consegue agradar, tanto que as travas de segurança do prédio é por reconhecimento facial do veterano e sem querer ele acaba ficando com o tablet do chefe, que uma vez roubado por criminosos, faz com que todo o local se torne um grande perigo. Como a família do protagonista vive no arranha-céu, Will precisa entrar no prédio e resgatar sua esposa e filhos.
Pessoalmente, me diverti assistindo Arranha-Céu, é um daqueles filmes de desligar o cérebro e só apreciar as cenas de ação. Mesmo sem nenhum ponto muito forte, e até com alguns vários tropeços honestos, como diálogos fracos e falta de criatividade com o conceito, o resultado é um bom filme de Temperatura Máxima pra ver depois de um almoço de família.
E Thurber é de uma humildade fantástica ao assumir que sua ação é, na verdade, uma comédia. A ação em si está nas entrelinhas (explícitas, mas entrelinhas) apenas. É desse jeito que ele (o diretor) concentra o seu olhar em cada passo do seu protagonista, utilizando diversos contra-plongées (filmagem de baixo para cima) para engrandecer um home que já é enorme. São poucas as situações, por exemplo, em que o diretor decide posicionar a câmera na altura dos olhos de Dwayne Johnson. Muito menos acima. A questão é demonstrar que Will é quase um super-herói, sem dimensionar sua personalidade, mas engrandecendo a sua persona. Até mesmo quando há uma arma apontada para sua cabeça.
Aliás, fiquei muito ressentido por terem desperdiçado possíveis cenas ao amanhecer e durante o dia (o filme se passa quase inteiramente à noite), pois obviamente os visuais do prédio ficariam espetaculares.
Apesar da equipe de imagem fazer um ótimo trabalho com A Pérola – tem várias cenas em um parque que fica no andar 98 e é deslumbrante -, é palpável a falta de criatividade para lidar com o conceito, sendo que as infinitas possibilidades são o que tornam esse conceito interessante. Senti que a produção achou uma ideia ótima e depois não soube o que fazer com ela, faltou inspiração. O filme acaba apelando para cenas clássicas como os protagonistas atravessando pontes quebradas, personagens com asma em meio a incêndios e a sequência em que The Rock pula de um guindaste para dentro do prédio – exposta em todos os trailers e cartazes.
A família, aliás, tem ótimos momentos ao longo da projeção. A autoconfiança da filha Georgia é revigorante e empoderadora, enquanto o papel de “dama em perigo” fica com seu irmão, Henry, e mesmo assim é confrontado por momentos inspiradores aqui e ali. Neve Campbell (minha eterna Sidney, da quadrilogia Pânico) tem duas ou três cenas de luta em que mostra a que veio e carrega o filme junto com Dwayne Johnson até o final – aliás, sinto que se o filme não tivesse esse ator como protagonista, teria se beneficiado muito de um reposicionamento de marca, vendendo a produção com o casal na frente do holofote, em vez de apenas Johnson.
Nessa perspectiva, a junção de clichês de filmes de ação em Arranha-Céu: Coragem sem Limite funciona sempre a seu favor. Se o background da personagem de “The Rock” já desponta como um exagero, revelando-o como um veterano de guerra e ex-líder de operações de resgate do FBI, o desenvolvimento agiganta isso: ele precisa limpar o seu nome da acusação de ter sido o causador de um incêndio criminoso no edifício mais alto do mundo e, além disso e ao mesmo tempo, ele assume a responsabilidade de salvar a sua família que está presa dentro do prédio, encontrar os culpados por tudo e salvar o magnata que construiu o monumento com mais de 200 andares. Se está pouco, o glorioso Will Sawyer (Johnson) perdera boa parte de uma das pernas durante uma das operações de resgate e conhecera sua esposa justamente ao ser salvo.
Enquanto um resumo mais breve do filme pode lembrar de alguma maneira o clássico de ação Duro de Matar (1988), a execução promove um afastamento. Mas é tudo claramente premeditado. Se os exageros nas situações são atualizados para o que o público busca encontrar hoje, distanciando-se de qualquer realidade proposta pelo filme estrelado por Bruce Willis, a influência da ação dos anos 1980 e 1990 encontra seu par exatamente na icônica série MacGyver – Profissão: Perigo, iniciada em 1985 e finalizada em 1992. E a consciência é tanta que, após Will utilizar fita adesiva para salvar tudo, em um diálogo ele dá a entender que basta ter essa ferramenta que qualquer coisa será possível, o que instantaneamente remete ao agente MacGyver, que portava consigo fita adesiva, fósforos e um canivete suíço (e de vez em quando chiclete) – e geralmente isso bastava.
Os arcos dramáticos do personagens não chegam a decepcionar, justamente por se tratar de um filme de ação pipoca, em que as expectativas são baixas. O amor da família e, em especial, do amor de Will por sua esposa e filhos, é o maior pilar dramático do filme e é constantemente posto à prova em todas as cenas de ação. E, embora o filme evite a todo custo entrar em qualquer debate sobre a existência de um prédio como A Pérola (tanto na frente tecnológica quanto nas social e econômica), não se sente falta de algum outro pilar. Essa é a história de Will e sua família, o arranha-céu é apenas o pano de fundo.
O mesmo se repete no clímax, que desde o início do filme promete ser visualmente deslumbrante por se passar dentro da estrutura esférica no topo do prédio – uma sala composta por centenas de telas de ulta-resolução, capazes de criar qualquer cenário e realidade através da tecnologia. O triste é que essa estrutura é utilizada apenas como uma sala de espelhos para confundir os personagens, tradição presente em qualquer filme de temática circense.
A médica Sarah (Neve Campbell), esposa de Will, e os gêmeos (McKenna Roberts e Noah Cottrell), o acompanham nessa missão, se mudando para o prédio por 6 meses antes do filme começar – no dia que Will apresenta sua avaliação e é oficialmente contratado (lê-se: ganha acesso aos protocólos de segurança d’A Pérola).
Quando qualquer fuga de clichês parece impossível; quando as situações mais previsíveis são como um tsunami que se aguarda na beira-mar (para citar Impacto Profundo, de 1998); quando não há mais para onde recorrer em meio a uma situação caótica... é hora de incluir Dwayne “The Rock” Johnson como protagonista.
Mas Thurber é, de fato, filho das comédias. À frente de Com a Bola Toda (2004), Família do Bagulho (2013) e Um Espião e Meio (2016), seu trabalho alcançou bom reconhecimento a níveis do gênero. Seu tropeço – praticamente unânime de público e crítica – foi quando adaptou para o cinema e dirigiu seu filme que mais tem inclinações dramáticas, o fraco Usina de Sonhos (2008). Thurber é um diretor que sabe encontrar graça na adversidade e, acima disso, tem controle total sobre o que o seu elenco pode fazer.
A ideia de se ter uma cidade completa dentro de um prédio é algo que nós, que fomos crianças no fim dos anos 90 e início dos anos 2000, tivemos contato, é aquela ideia da tecnologia engolir até o espaço físico da sociedade, e é uma premissa interessantíssima para se tratar no cinema. Aqui, evidentemente, não tem muito espaço para as questões filosóficas e sociológicas disso, então tudo o que o filme pode fazer é nos entregar o prazer de ver essas tecnologias em ação. E isso meio que falta.
Além de Dwayne Johnson, destaque para Neve Campbell que deu personalidade a esposa do protagonista, que não é uma mulher boba e medrosa que fica esperando a ajuda do marido. Na verdade, Sarah consegue resolver boa parte dos problemas sozinha, o que foi bem positivo no enredo.
Arranha-Céu: Coragem sem Limite está longe de ser um Duro de Matar ou ter a influência de uma série que durou sete anos fazendo sucesso. Ele (o filme) quer divertir, entreter, sem medo de parecer tosco ou desprezível para o público menos adepto. E, ultimamente, escalar Dwayne Johnson como protagonista já é mais da metade do caminho para isso. Se “The Rock” não tem a competência de um Bruce Willis como ator de fato, seu carisma é igual ou ainda maior do que o do ator alemão. Deem fita adesiva a esse homem e uma sala com paredes verdes que ele será capaz de salvar qualquer coisa... até mesmo um filme.
Arranha-Céu – Coragem sem Limite é um filme que cumpre o que promete, com muita ação, tensão, com um pouco de drama em alguns momentos, com uma família carismática. O tipo de longa que é puro entretenimento e deve agradar os fãs do gênero.