Em uma época em que Pabllo Vittar e Gloria Groove são recordistas de prêmios e aclamadas pelo público, é fácil assimilar que se estivesse viva, Lacraia, que terá seu nome de batismo preservado nesta reportagem, teria mais reconhecimento do que jamais teve.
"Ela estava muito doente. Falei com a mãe dela há duas semanas. Sei que estava internada, mas não sei o que era, o que foi", falou o funkeiro ao UOL. Ele contou que recebeu a notícia por meio de amigos nesta manhã.
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O primeiro sucesso da dupla veio em 2002 com a música “Vai, Serginho!” e, depois, com “Égua Pocotó”, que ficou conhecida como “Eguinha Pocotó”, uma das canções mais tocadas nas rádios brasileiras em 2003.
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Segundo Caia, nos anos 1990, Lacraia estudou Teatro Expressionista da Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS. Por lá, ela ainda não era conhecida pelo nome que lhe conferiu projeção nacional, mas sim por Margarete Robocop e Volpi Jones.
Caia aponta ainda que Lacraia em inúmeros momentos sofreu racismo e transfobia durante participações na televisão, sendo exposta ao ridículo e se limitando ao mero papel de alívio cômico para a audiência.
Cheia de sonhos, a artista acabou por não realizá-los. Em 2011, ela foi internada no Hospital Universitário Gaffrée Guinle, na Tijuca, no Rio de Janeiro. Pouco tempo depois, aos 33 anos, ela acabou por morrer.
“Ô meu pai celestial, acabei de receber uma notícia tão triste, a animadíssima LACRAIA faleceu hoje às 5h da manhã. QUE DEUS A TENHA!”, escreveu o promoter.
Para ter ideia do fenômeno, as músicas de Lacraia e Serginho serviram de trilha nos jogos de vôlei de praia nas Olimpíadas de Atenas em 2004, da companhia de dança Debora Colker, da Grande Família, do Programa do Didi.
MC Serginho conta que, ainda hoje, a artista é relembrada pelos fãs. Quando começaram a carreira juntos, Serginho foi questionado no universo do funk sobre a dupla com Lacraia.
Provavelmente, lá aprendeu a lidar com maquiagem, pois pouco tempo depois começou a se apresentar como transformista - termo antigo para referir-se à drag queens - em casas noturnas do Rio. Entretanto, a carreira artística nunca se sobrepôs ao trabalho fixo.
Como a grande imprensa não noticiou o fato à época, a causa da morte oscila entre tuberculose e pneumonia. O Uol, por exemplo, baseou-se em um tuíte de David Brazil para cobrir o fato.
E embora ela fosse uma atração da televisão, muitas vezes a forma como era tratada pela mídia não era das melhores. Caia cita, por exemplo, o episódio no Programa da Eliana em que Lacraia encenou um casamento fake.
Já na televisão, no “Programa da Eliana”, Lacraia encenou um casamento falso, no qual o noivo se recusou a tratá-la no feminino e não a beijou ao final da cerimônia. Para Caia Coelho, ativista trans que estuda a vida da artista, "o abandono era supostamente a ‘graça’ do quadro”.
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Porém, a carreira como DJ não durou muito tempo. Em 2011, Lacraia morreu por conta de uma tuberculose aos 33 anos. "Não podemos esquecer sua história. Ela abriu portas para muitas travestis do funk hoje!"
Batizado de Marcos Aurélio da Silva Rosa, Lacraia recebia muito apoio da mãe, Maria Alice, que além de cantora e dançarina, Lacraia foi camareira de uma sauna gay, maquiadora, cabelereira e drag queen.