Cada espectador tem o direito de se dispor como quiser diante de um filme. Há quem queira apenas apreciar a história contada, há quem queira procurar pelas entrelinhas, há quem queira analisar tecnicamente... E todas as formas de ser espectador são válidas. Eu, espectadora de terror desde o ventre da minha mãe, gosto de tentar entender qual é a metáfora dos filmes de terror, qual alerta ou mensagem encontra-se escondida por trás da trama. A Netflix apostou em mais uma adaptação de Stephen King com Campo do Medo e, ao invés de entregar terror, acaba mexendo em um vespeiro... e não mexeu com a delicadeza merecida.
Adaptações de livros e contos do Stephen King costumam agradar poucos leitores e, por vezes, provocam o próprio escritor. Acredito que falta a compreensão de que os livros de King causam medo justamente pela habilidade que ele tem de criar uma ambientação assustadora e talvez por isso O Iluminado (1980, de Stanley Kubrick) seja um grande filme de terror: há muito mais um clima de terror do que situações aterrorizantes em si. Se a direção não for capaz de pelo menos traduzir a atmosfera criada pelo autor em suas obras, as chances de a adaptação não dar certo são enormes.
No último fim de semana, a plataforma de streaming lançou oficialmente o horror Campo do Medo, baseado em uma novela (In the Tall Grass) escrita por King em parceria com seu filho Joe Hill. O longa conta com a direção de Vincenzo Natali, um cineasta responsável por vários filmes de horror cult, como Cubo e Splice: A Nova Espécie.
2019 está sendo um grande ano para os fãs de Stephen King. Além de um novo livro do autor, várias de suas obras estão sendo adaptadas para os cinemas e para a TV, com dois grandes filmes em live-action já tendo sido lançados no cinema (Cemitério Maldito e IT: Capítulo 2) e mais um por vir (Doutor Sono). E é claro que a Netflix não ia ficar de fora da jogada.
Por falar em loucura, o filme acaba entrando em uma espiral bem curiosa, já que seus acontecimentos parecem ser bem embaralhados temporalmente. Isso funciona muito bem para desorientar o público, casando muito bem com o cenário. No entanto, isso acaba tomando mais tempo de tela do que deveria e o filme se demora mais querendo “iludir” do que construir personagens ou uma história particularmente sólida.
O diretor e roteirista Vincenzo Natali já não é um nome completamente desconhecido após ter dirigido Cubo (1997) e Splice – A Nova Espécie (2009), além de episódios de séries como Hannibal, The Strain e Westworld. Ainda assim, parece pouco experiente ao fazer de Campo do Medo um filme que não se esforça para nos colocar no lugar dos personagens. Como um bom argumento nascido em Stephen King, havia potencial para obra-prima, mas Natali cria um suspense dramático que apenas leva os personagens de um ponto a outro da forma mais simples possível.
Campo do Medo não veio para revolucionar o cinema de horror e nem para se provar mais um grande acerto da Netflix. Mas numa maré de filmes medianos e ruins dentro da plataforma de streaming, o longa até nos deixa com um suspiro aliviado, além de ser uma adaptação decente de Stephen King.
A trama inicial segue dois irmãos, Becky e Cal DeMuth (respectivamente, Laysla de Oliveira e Avery Whitted), que dirigem por uma estrada até pararem em frente a uma plantação no meio do Kansas. Lá, eles acabam ouvindo o chamado de socorro de um garoto, o jovem Tobin Humboldt (Will Buie Jr.), e tentam resgatá-lo dentro do matagal… apenas para se verem presos em um campo de horrores.
Com uma proposta mais surreal e uma atmosfera bem diferente, o longa conta com a direção de Vincenzo Natali – mais conhecido pelo horror cult Cubo. Mas será que o filme funciona, como obra cinematográfica e como adaptação do Mestre do Horror? Confira a nossa crítica a seguir!
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Entre tantos lançamentos, o filme luta para se destacar, mas consegue nos apresentar uma atmosfera sinistra e uma proposta bem original, até mesmo dentro do legado das obras de King. Infelizmente, ele acaba sendo um pouco refém de seus protagonistas e de sua própria ambição.
Campo do Medo nos coloca diante de um grupo de pessoas que estão perdidas em um loop espaço-temporal aparentemente sem lógica dentro de um campo alto o suficiente para que seja impossível visualizar a saída.
É outubro – mês do horror e do Halloween –, e como é de praxe, a Netflix está produzindo uma nova leva de filmes originais. Na última sexta-feira (04), o serviço de streaming soltou o longa Campo do Medo, baseado em uma novela escrita por Stephen King em co-autoria com seu filho, Joe Hill.
Sinopse: Após ouvir o chamado de socorro de uma criança, dois irmãos se aventuram dentro de uma grande plantação no Kansas, mas logo descobrem que pode não haver uma saída… e algo muito maligno espreita dentro do matagal.
Ao ver qualquer filme, nossa empatia é ativada e somos capazes de compartilhar os sentimentos dos personagens. No cinema, uma boa equipe é capaz de intensificar a nossa empatia. Campo do Medo nos coloca diante de um grupo de pessoas que estão perdidas em um loop espaço-temporal aparentemente sem lógica dentro de um campo alto o suficiente para que seja impossível visualizar a saída. Não é difícil imaginar que, nesse caso, compartilharíamos com os personagens sentimentos como angústia por não encontrar uma saída, desespero ao encarar a realidade de que é impossível lidar com o campo de forma lógica (sobretudo estando grávida) e claustrofobia por estar tanto tempo rodeado por folhas e sem conseguir enxergar muito longe.
Com alguns toques característicos do autor no roteiro – o horror “rural” que evoca a franquia Colheita Maldita e a presença de uma criança no cerne da trama, relembrando O Iluminado e Cemitério Maldito, ainda que em menor escala -, o longa até parece uma das várias adaptações televisivas da obra de King, que foram produzidas entre os anos 80 e 90.
Dificilmente um filme (de terror) é completamente descartável e é sempre bom fazer o exercício de encontrar algo que foi bem trabalhado, mesmo que a obra aparentemente pareça ter nada de aproveitável. Em muitos casos, a sensação é de que estamos diante de uma boa ideia mal executada: um argumento que poderia ser muito bem desenvolvido, mas que infelizmente caiu nas mãos erradas.
Quando a trama começa a se desenvolver, somos apresentados a novos personagens, como Ross Humboldt (Patrick Wilson), o pai de Tobin, ou Travis McKean (Harrison Gilbertson), o namorado de Becky, que ajudam a motivar a trama e criam o conflito quando uma força sombria mostra sua presença aos poucos.
Com grande valor de entretenimento, Campo do Medo é um bom filme para quem já gosta de Stephen King e quer ver mais de suas obras adaptadas. É uma pena que seu roteiro não invista o suficiente nos personagens para dar-lhe uma maior profundidade, mas no fim das contas – assim como os mortos do matagal, que não se mexem – o longa é inofensivo na medida do possível.
Claro que há um elemento redentor no elenco, e trata-se de Patrick Wilson. O ator que já é bem familiarizado com o gênero de horror (tendo participado de franquias como Invocação do Mal e Sobrenatural) carrega seu personagem com um exagero intencional, enquanto ainda explora muito bem as várias camadas de loucura ao qual está sujeito.
A maior questão levantada pelo final de Campo do Medo é se, ajudando Tobin a se libertar e alertando Becky e Cal para longe do campo, Travis quebrou o ciclo do tempo e também libertou a si mesmo, além de Ross e Nathalie.
Além disso, a narrativa apresenta seres estranhos, com rostos não humanos, que são introduzidos como meros acessórios: não são construídos para nos dar medo, tampouco são surpreendentes. Infelizmente, esses seres são as criaturas que nos conduzem ao que deveria ser o clímax do filme: o sacrifício do bebê. A sequência toda, no entanto, é um enxerto confuso, que não se atreve a mostrar o sacrifício e mais uma vez tem êxito ao não comprometer a zona de conforto do espectador. Ao final, o sacrifício não se justifica, nada é alterado, e o que nos resta é o questionamento sobre o que eram aqueles corpos sob a terra.
A premissa inicial já dá conta de boa parte da história e mostra como a atmosfera é importante para a criação de sua trama. Assim como Jogo Perigoso, de Mike Flanagan, ou Cujo, de Lewis Teague (outras exímias adaptações de King), o filme depende muito da sensação de claustrofobia e de medo do desconhecido, enquanto somos colocados na pele dos protagonistas.