A pergunta é muito sugestiva e pode causar curiosidade em muitas pessoas. Afinal, como um padre pode ser eleito ao Episcopado algum dia? A dúvida começa a ser respondida de acordo com o cânon 378 do Código de Direito Canônico, que destaca os requerimentos para desempenhar o ofício: é preciso ter fé firme, bons costumes, piedade, zelo das almas, sabedoria, prudência e ser eminente em virtudes humanas e dotado das demais qualidades; gozar de boa reputação; ter ao menos, trinta e cinco anos de idade; ter sido ordenado presbítero pelo menos há cinco anos e ter adquirido o grau de doutor ou ao menos a licenciatura em sagrada Escritura, teologia ou direito canônico, em um instituto de estudos superiores aprovado pela Sé Apostólica, ou ao menos ser verdadeiramente perito nestas disciplinas.
Esta lista tríplice é levada a Congregação para os Bispos – que é um organismo da Santa Sé – e ali é colocada uma ordem entre os candidatos em primeiro, segundo e terceiro lugar com as justificativas. Esta lista é levada ao Papa e é apresentado o dossiê de cada um dos candidatos. O Papa diante dessas informações que recebe, coloca à frente do nome do escolhido a sua assinatura.
Segundo Dom Geraldo Lyrio Rocha, nomeado bispo pela primeira vez há 36 anos, sendo auxiliar de Dom Silvestre na Arquidiocese de Vitória, essa pergunta tem uma resposta complexa: “O ministério episcopal não é por escolha do candidato. Ninguém se candidata ao episcopado. É um chamado da Igreja. Então entre os presbíteros, alguns serão chamados para exercer o ministério episcopal sendo colocados à frente de uma porção do povo de Deus que constitui uma diocese”.
Mesmo quando se fala, no ponto 8, da "promoção e defesa dos direitos humanos, mundo do trabalho, da cultura, da informação); promoção e acção social, com particular aos pobres e mais desfavorecidos", isso é perguntado numa lógica de que "os leigos, "os pobres e os desfavorecidos" são apenas destinatários de evangelização, de formação, dos sacramentos, de acção social" e não considerados como protagonistas dentro da Igreja, observa outro dos comentadores - todos pedem o anonimato.
Em relação a hierarquia, ele explica que um bispo não deixa de ser padre. Ele se torna um sucessor dos Apóstolos pela ordenação episcopal. Um novo bispo é inserido em um Colégio Apostólico que tinha Pedro à sua frente. Hoje os bispos sucedem os apóstolos e tem à sua frente o sucesso de Pedro, que é o Papa.
Dom Geraldo, que também foi o primeiro Bispo da Diocese de Colatina, o primeiro Arcebispo da Arquidiocese de Vitória da Conquista, na Bahia e o Arcebispo da Arquidiocese de Mariana, em Minas Gerais – uma das mais antigas do Brasil, conta que seu sonho sempre foi ser padre e ficar à frente dos fiéis, exercendo seu ministério em uma paróquia e realizando o serviço pastoral. Cumpriu por 17 anos esse desejo até ser escolhido pelo papa João Paulo II para o ministério episcopal.
O questionário começa por pedir referências ao "aspecto físico, saúde, resistência ao trabalho" e "condições da família, sobretudo no referente a eventuais manifestações de doenças hereditárias".
Aquele que está à frente com a responsabilidade de conduzir a Igreja particular é o Bispo Diocesano. No nosso caso, como Vitória é uma Arquidiocese, ela tem um Arcebispo Metropolitano. Ele é o pastor dessa porção do povo de Deus que constitui a Igreja Particular de Vitória. Dadas as dimensões de uma Arquidiocese, o Bispo pode ter um auxiliar para colaborar com ele no pastoreio e assim o solicita quando necessário.
Quando alguém está na lista de candidatos a bispo de uma diocese, a nunciatura envia o inquérito a várias pessoas (quase todos padres e bispos, por vezes alguns leigos) pedindo segredo. Este secretismo tem sido, no entanto, cada vez mais mal guardado, pois os nomes postos a correr são com frequência conhecidos antes da nomeação.
Desde há muito, o bispo espanhol Pedro Casaldáliga, que trabalhou no Brasil desde os anos 1960 e morreu no mês passado, dizia ser "contra um sistema de nomeações episcopais que é secreto e autoritário, que não respeita o caminho e a opinião das igrejas locais" e que não é "evangélico".
Este inquérito de duas páginas é normalmente enviado pela nunciatura apostólica (embaixada) do Vaticano em cada país e foi revelado agora na íntegra pelo jornal digital 7Margens.
Os candidatos a bispos dentro da Igreja Católica são sujeitos a um processo confidencial e secreto, que nas últimas décadas tem sido posto em causa e que inclui, na sua fase principal, um questionário em treze pontos e com dezenas de perguntas. Entre o que se questiona acerca dos candidatos estão perguntas sobre se usa hábito eclesiástico, se é fiel ao magistério católico, se tem capacidade intelectual, se se opõe ao celibato obrigatório e à ordenação de mulheres, se segue a doutrina sobre matrimónio, ética sexual e justiça social, ou se é estimado publicamente "pelos sacerdotes, povo e autoridades". Não se pergunta, no entanto, nada sobre o evangelho - a palavra está ausente do documento.
Pelo meio, solicita-se informação sobre a "conduta moral, comportamento com as pessoas" ou "relação com as Autoridades do Estado (respeito e autonomia)", mas também sobre se o candidato a bispo vive e testemunha as "virtudes humanas, cristãs e sacerdotais", tais como "prudência, justiça, rectidão, lealdade, sobriedade, fé, esperança, caridade, obediência, humildade, piedade, celebração quotidiana da Eucaristia e Liturgia das Horas, devoção mariana".
José Eduardo Borges de Pinho, professor de Teologia na Universidade Católica, defendeu em 1987, no Congresso Nacional de Leigos católicos, que se deveria "voltar a sonhar uma Igreja [...] em que os cristãos tenham uma palavra importante a dizer quanto às escolhas dos seus padres e dos seus bispos, eventualmente através de uma expressão de opinião em voto secreto".
Entre os desafios de ser um bispo, o Arcebispo Emérito destaca o pastoreio neste momento atual que vivemos de mudança de época e que atinge sobretudo os valores. Ele ressalta que há uma desorientação sobre o que é certo e o que é errado, mudanças de compreensão dos valores da família, da religião e até mesmo da compreensão de Deus. Já entre as maiores alegrias, para ele está a de ordenar um novo padre. Ele também ressalta a convivência com os irmãos bispos, padres e o acompanhamento das comunidades e dos leigos os quais assumem seu papel no mundo e descobrem cada vez mais o sentido da Fé e da presença de Jesus Cristo em suas vidas.
No capítulo doutrinal, o questionário é abundante: interroga-se sobre a "adesão convicta e leal à doutrina e ao magistério da Igreja", a "fidelidade e docilidade ao Santo Padre, à Santa Sé, à Hierarquia", a "estima e acolhimento do celibato sacerdotal" como é regulado pela Igreja ou a observância das normas de culto e do hábito eclesiástico.
"Não se valoriza o papel do bispo na promoção do protagonismo dos leigos e das leigas em processos participados de tomada de decisão, de evangelização, etc., com vista à transparência nas opções tomadas, nos processos e nas finanças, e tão-pouco se valoriza a capacidade de trabalhar em equipa", diz um dos observadores contactados.
Hoje, mantém a opinião: "Não tenho nenhuma dúvida, pelas novas circunstâncias e pelos tempos que vivemos, de que devemos repensar o processo de escolha", diz. Criticando o atual sistema como favorecendo "um certo carreirismo eclesiástico" e por poder ficar marcado "por um claro nepotismo", afirma que o processo não tem de ser como na política, mas deve permitir a participação. Como está, não corresponde "ao que deve ser", afirma.
Um processo que deve ser secreto usa um questionário muito criticado. Cada vez mais vozes defendem que a escolha de bispos católicos deve ser fruto da participação dos crentes e não de escolhas que podem acentuar o carreirismo e o nepotismo.
Diferente da formação para ser um sacerdote, para tornar-se bispo não existe um curso de preparação. O bispo é um padre que é escolhido para esta missão. O processo é conduzido pela Nunciatura Apostólica a qual recebe a indicação de candidatos para ocupar as sedes que estão vagas. A nunciatura faz uma grande consulta a respeito do candidato de forma sigilosa e cabe ao Núncio escolher entre aqueles que foram indicados, os componentes que irão para uma lista tríplice que será encaminhada à Roma, acompanhada de um dossiê sobre cada um dos candidatos.
Cada país possui a sua congregação de bispos que não é um sindicato ou associação de classe. É um espaço de troca de experiências, harmonia das ações, propostas comuns para dar uma unidade a missão à Igreja dentro de um território nacional. O Brasil possui a maior conferência episcopal do Mundo: são 481 bispos, sendo 169 eméritos e 312 na ativa, segundo dados atualizados até dezembro de 2019. Cada conferência tem seu estatuto próprio e no caso da CNBB, o estatuto prevê a eleição da presidência a cada 4 anos. Anualmente, este presidente se encontra com o Papa e apresenta um relatório sobre a ação da Igreja no País. Dom Geraldo Lyrio Rocha foi presidente da CNBB de 2007 a 2011.
Três pessoas ouvidas para comentar o texto - uma, que já respondeu ao questionário; outra, que apenas o viu; e a terceira, que não o conhecia - sublinham que o documento coloca demasiado enfoque nas questões disciplinares e pouco em questões que tenham a ver com a escuta de pessoas e da realidade, ou com a atenção a temas que o Papa Francisco tem proposto como importantes: economia, exploração dos mais fracos, opção preferencial pelos mais pobres ou proteção do ambiente deveriam constar também, argumenta um dos comentadores, que, em qualquer caso, prefere um processo mais aberto e transparente.
Um questionário sigiloso e um processo secreto para nomear bispos são, entretanto, cada vez mais postos em causa, não só por teólogos como por comunidades cristãs, padres e mesmo por muitos bispos, que têm defendido mais participação dos crentes no processo de escolha, à semelhança do que acontecia nos primeiros séculos do cristianismo. Em agosto, um grupo de 83 padres e bispos do Brasil escreveu mesmo ao Papa a pedir mudanças na "forma de escolher os bispos", pois a nunciatura não "consulta as igrejas locais". Francisco prometeu falar com os responsáveis da Cúria Romana e com o núncio sobre o assunto.
Um cardeal precisa receber dois terços dos votos para ser eleito papa. Depois de cada votação, os votos são queimados. Se sair uma fumaça preta da capela, haverá outra votação. A fumaça branca indica a eleição de um novo papa.
O conclave se inicia entre 15 e 20 dias depois da Sé Vacante, período entre a morte ou renúncia de um papa até a escolha do próximo. Como Bento XVI renuncia em 28 de fevereiro, o processo decisório deverá começar em 15 de março. A partir daí, 117 cardeais com menos de 80 anos peregrinarão para Roma.