Existe razão nas coisas feitas pelo coração? O grande Renato Russo acha que não e escreveu a história de um casal controverso, com características muito diferentes e que teria poucas chances de dar certo na vida real.
Enquanto ela gostava de falar sobre política, magia, meditação, assuntos super amplos e diversos, o Eduardo continuava em uma rotina mais adolescente, de ir pra escola e ver TV.
Renato e Leonice eram tão próximos que os dois sempre se falavam por telefone, por onde o líder do Legião Urbana lhe mostrava as novas letras que escrevia. Um certo dia, porém, Renato Russo lhe mostrou uma música que compôs inspirada na relação dela com Fernando.
Aos 63 anos, Leonice lembra de Renato, que morreu em 1996 em decorrência de complicações da Aids, como seu segundo amor de juventude. O primeiro e maior deles é Fernando, obviamente, e com Renato Russo era uma paixão ‘não romântica’.
Pouca gente sabe, mas o casal da letra existe mesmo –ou, pelo menos, quase. Lançada em 1986 e agora adaptada para o cinema, a faixa do Legião Urbana tomou como inspiração o relacionamento de uma das grandes amigas de Russo, a artista plástica Leonice de Araújo Coimbra, com o marido, Fernando Coimbra.
A indiferença inicial se deve ao fato de ela ser uma pessoa reservada e de não se reconhecer na personagem imaginada por Russo. Leonice não estudou medicina nem era tão mais velha que Fernando –que, por sua vez, ela considera o verdadeiro intelectual da relação.
"Eu acredito que o Renato escreveu essa música idealizando um pouco a minha mãe; o que faz sentido, porque ele era mais próximo dela. Mas a energia da história, esse encontro de amor, isso realmente existe, porque eles são referência de um casamento bacana, são mesmo como 'feijão com arroz'”, completa.
Depois, eles foram trabalhar juntos num jornal publicado pelo Ministério da Agricultura e, com o tempo, se tornaram grandes amigos. Leonice lembra uma viagem que ela fez com o marido no início dos anos 1990, para Nova York. Ao encontrar o estúdio que haviam alugado, se deparou com Russo, recém-chegado à cidade, na porta, perguntado se poderia se hospedar com eles –de início, ela não gostou da ideia, mas no fim as férias foram "bárbaras".
Nesta estrofe, a música dá um salto no tempo e dá a entender que Eduardo e Mônica agora já se casaram, construíram uma casa e tiveram filhos gêmeos. Venceram juntos algumas dificuldades.
Na época em que ele compôs a faixa, o músico ligou para a amiga –como fazia com frequência, enquanto trabalhava em novas canções– e mostrou a ela o que, ninguém sabia ainda, se tornaria um verdadeiro fenômeno musical.
Acabaram indo viajar e a Mônica se mostrava com uma espécie de líder da relação, explicando para o Eduardo coisas sobre o céu, a terra, a água e o ar.
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O casal conheceu Renato Russo nos anos 1980, num centro acadêmico da Universidade de Brasília, onde Fernando estudava antropologia. O músico estava lá para tocar com sua banda e Leonice ficou hipnotizada pela performance. "Nós nos apaixonamos fraternalmente de cara", diz ela.
A mulher conta que alguns aspectos de sua vida foram adaptados na música. Leonice, por exemplo, não sabe falar alemão, mas uma de suas avós era alemã — daí pode vir a explicação .
A relação entre ela e o líder do Legião se fortaleceu quando os dois trabalhavam em um jornal publicado pelo Ministério da Agricultura. Nos anos 1990, ela conta que fez uma viagem com Fernando para Nova York.
Atualmente, Leonice mora no México, em virtude do trabalho do marido. Fernando é embaixador do Brasil no país — algo que combina pouco com o que vemos de Eduardo. Nina Coimbra, filha do casal, que também é artista plástica, enxerga o pai como o completo oposto do personagem retratado por Renato.
Na época, o músico passou por lá para se apresentar com sua banda. Leonice diz que ficou encantada com a apresentação. "Nós nos apaixonamos fraternalmente de cara".
Leonice fala com este repórter do México, para onde se mudou há poucos meses com o marido, que é embaixador do Brasil no país, carreira que é difícil imaginar Eduardo trilhando. Filha do casal, a também artista Nina Coimbra –que não ficava de recuperação– concorda que o pai é o oposto do personagem. "Na música o Eduardo parece um pouco bobo, ingênuo, e meu pai não é nada disso", afirma.
O Eduardo fantasiado por Renato Russo em sua célebre canção era ingênuo e pouco dado ao estudo. A Mônica se preparava para ser médica e era bem mais velha. Lá para o final da letra, eles não podem ir viajar porque o filhinho ficou de recuperação. Mas as figuras que inspiraram o artista em "Eduardo e Mônica" não eram bem assim.
"Eu lembro de ter, durante a infância, essa noção de que o amigo da minha mãe era um pop star. E o Renato gostava disso. Quando estávamos no Brasil, ele ia nos buscar na escola, fazia tudo ser uma grande cena, com todo mundo enlouquecido. Ele gostava de estar entre crianças, receber esse tipo de afeto, de um público que dava uma atenção menos agressiva para ele", conta ela.
O clássico foi escrito por Renato Russo e lançado em 1986, como parte do álbum ‘Dois’. Um dos hits mais lembrados e adorados do Legião Urbana até hoje, 'Eduardo e Mônica' transcende gerações e é uma das grandes canções da música brasileira.
Renato Russo foi uma presença constante em sua vida e na de Nina, a filha. Mesmo quando a família começou a mudar de um país para o outro, por causa da carreira de Fernando na diplomacia, o músico sempre se fez presente.
Segundo a Folha, as viagens da família também inspiraram Renato a escrever outra canção para a amiga: “Uma Outra Estação”, que faz parte do álbum com o mesmo nome, que foi lançado em julho de 1997.