O complexo manicomial conhecido por Cidade dos Loucos foi fundado em 12 de outubro de 1903, em Barbacena, Minas Gerais. Antes de ser um local focado no "tratamento" psiquiátrico, o Hospital Colonial de Barbacena tratava pacientes vítimas da tuberculose, o que explica a localização afastada do hospital, em cima de uma montanha. Local perfeito também para excluir os grupos marginalizados da sociedade.
Assim, eram responsáveis pelo afastamento deles da sociedade, enquanto se esperava torná-los aptos ao mercado de trabalho. Isso foi responsável pela dor e até a morte de muitos, legitimados pelo Estado.
Os tratamentos funcionavam à base de tortura: utilizavam cadeiras elétricas, solitárias e camisas de força. Os pacientes eram submetidos a situações precárias, como fome e sede. Em alguns casos, chegavam a beber a própria urina. Nos pátios, viviam nus e em meio a ratos e baratas, além de urinarem e defecarem no chão.
Com as diversas mortes ocorridas no interior do local, tornou-se inviável o enterramento de todas as vítimas da Colônia de Barbacena. Isso criou um problema para a instituição, que foi facilmente resolvido por membros corruptos da ala administrativa: o tráfico de cadáveres.
A maioria dos doentes não tinha direito a cama. Dormiam em capins, agarrados uns aos outros para espantar o frio das serras geladas de Barbacena. A superlotação do hospício era a justificativa para o descaso. Em 1960, em um lugar projetado inicialmente para 200 pacientes, havia 5 mil. Muitos que passavam por tudo isso nem tinham transtorno mental.
Agora, Débora quer descobrir o paradeiro da irmã, a segunda filha que Sueli teve no hospital. “Ela foi entregue para adoção. Eu só sei que nasceu no dia 15 de junho de 1986, é dois anos mais nova e o nome que minha mãe escolheu pra ela foi Luzia Rezende. Mas devem ter trocado o nome”.
Logo que se tronou um centro de tratamento de "loucos", o Hospital de Barbacena foi considerado referência nacional no tratamento a transtornos psiquiátrico, ainda na República Velha. Isso fez com que a instituição fosse amplamente procurada por aqueles que queriam abandonar seus renegados, e o local, que tinha capacidade de 200 leitos, ficou superlotado, com mais de 5 mil pacientes.
Foi somente em 1961, quando o fotógrafo Luiz Alfredo conseguiu registrar os absurdos do Hospital Colônia, que a história começou a chegar até os olhos de todos. Mesmo assim, foram necessários mais 19 anos para que o hospital enfim fosse fechado.
A instituição era formada por diversos prédios e pavilhões, e cada um deles tinha uma especialidade. Entre eles estavam o Pavilhão Zoroastro Passos, para onde iam as mulheres indigentes, e o Antônio Carlos, a área dos homens indigentes.
Muitas pessoas eram colocadas no Manicômio de Barbacena pela própria família. Era o caso de mulheres indesejadas pelos maridos e parentes que tinham algum tipo de deficiência, transtorno ou distúrbio, como Síndrome de Down, autismo ou dislexia.
“Como eu fiquei nervosa, os funcionários me pegaram pelo braço e me levaram para a sala de tratamento com eletrochoque. Levei um choque enorme e fui ameaçada de ficar internada para sempre no hospício caso voltasse lá atrás do meu filho. Nunca mais tive notícia dele”.
Por esse motivo, Barbacena ficou conhecida como Cidade dos Loucos. O manicômio mais famoso foi erguido em 1903, em terras concedidas na Fazenda da Caveira, de Joaquim Silvério dos Reis, a princípio para o tratamento de tuberculosos.
Nos antigos manicômios, as mulheres que engravidavam não podiam ficar com os filhos. As crianças eram adotadas ou iam para orfanatos. A secretária Débora Soares nasceu dentro do hospício de Barbacena. Foi adotada por uma funcionária do lugar. Já adulta, Débora descobriu que a mãe biológica se chamava Sueli Rezende e que ela poderia estar internada no hospital psiquiátrico da cidade. Ao chegar ao local, ficou sabendo que a mãe havia morrido há um ano.
Conhecido pela tenebrosa alcunha de Holocausto Brasileiro, o Manicômio de Barbacena foi uma poderosa e atroz instituição psiquiátrica responsável por métodos de tortura e pela morte de muita gente em suas dependências, sob a acusação de loucura.
Em geral, além de doentes mentais, o Manicômio de Barbacena tinha como alvo indivíduos que desviavam dos padrões desejados pela sociedade elitista brasileira, como prisioneiros políticos, homossexuais, indigentes, prostitutas, pobres e minorias étnicas, sendo que praticamente 70% dos pacientes não apresentavam problemas psiquiátricos de verdade.
O bombeiro João Bosco, 48 anos, e a mãe Geralda Siqueira, 66 anos, ex-interna do hospício de Barbacena, também foram vítimas da política de afastamento entre mães e filhos nos manicômios. Geralda ainda foi vítima do isolamento no manicômio sem nunca ter tido transtorno mental. Órfã desde criança, ela foi morar aos 11 anos numa casa de família para ser empregada doméstica. Foi estuprada várias vezes pelo patrão, até ficar grávida. Para se livrar do problema, o patrão a levou para o hospício. “Eu levei o maior choque porque eu nunca tinha visto aquilo. Era horrível ficar naquela prisão, no meio daquela bagunça, sujeira, com uma porção de gente doente”, desabafa a ex-interna do hospício.
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Os métodos de tratamento e as condições do Manicômio causaram a morte de mais de 60 mil pessoas. O período em que mais morreram pessoas nessa instituição foi por volta de 1960 a 1970, no início do Regime Militar no Brasil (1964-1985).
Infelizmente, aqueles que conseguiram sobreviver às barbáries do hospital nunca tiveram seus danos realmente reparados, bem como aquelas famílias que para sempre tiveram suas vidas marcadas pelos absurdos cometidos pelo próprio governo da época.
“A gente encontrou histórias de pessoas que foram mandadas pro hospital para esconder uma gravidez, porque tinham perdido seus documentos ou porque o marido resolveu ficar com a amante”, constatou Daniela.
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